9 de nov. de 2005

Nova Iorque - parte 2

Um dia eu estava na fila para ir ao cinema e um sujeito veio me pedir dinheiro. Sim, dinheiro. Sim, isto acontece aqui, e -- pasmem! -- o cara parecia o Riquinho Rico com quarenta anos de vida e vinte e oito de bebedeira. Do longo monólogo do pedinte só entendi alguns trechos desconexos (a fala dele também era de quem bebia há vinte e oito anos), mas deles deduzi que ele estava com fome e frio; que ele não tinha dinheiro; e que ele fora expulso do seu abrigo porque tinham matado o seu irmão e ele tentara bater no assassino.

Talvez o leitor tenha treino específico ou até mesmo conselhos infalíveis para uma situação destas. Talvez as crianças nova-iorquinas sejam treinadas desde cedo para lidar com este tipo de situação ("Finja-se de morto e deixe que ele te fareje à vontade"). Da minha parte, eu não tinha muita idéia do que fazer. Mas não demorou muito e minha mão já tinha puxado o dinheiro da carteira, para espanto dos dois amigos que me acompanhavam e que tentavam duramente ignorar o pobre Riquinho. Ele, por sua vez, não se fez de rogado, pegou a nota, deu meia-volta e foi...

Não: ele parou depois de uns dez passos e voltou para perto de mim, o braço trêmulo esticado para a frente, a nota enrolada contra o meu peito.

--- Toma esse dinheiro de volta, porque se não eu vou levá-lo ao traficante e comprar crack!

O que faria o leitor experiente neste momento? Será que até mesmo o nova-iorquino adestrado tremeria ("Ih, acho que ele percebeu que estou respeirando!")? Eu quase ri da situação --- não me pergunte por quê --- e disse que não. Pedi e pedi e pedi que ele ficasse com a grana; disse várias vezes "God bless you" ou alguma outra coisa assim; tomei a mão dele e fechei-a em volta daquele um dólar (ou cinco dólares, sei lá) que eu tinha dado. Depois de algum tempo o sujeito ficou quieto, me olhou no fundo dos olhos de um jeito muito estranho, e foi-se embora.

Só agora no momento em que escrevo este texto é que este olhar final me parece fazer sentido. Foi decepção. Ele teve um minuto de lucidez, e desapontou-se porque eu não entendi que ele dificilmente teria outro.

2 comentários:

Lakshimi disse...

Robertinho de DEUS que estória é essa meu irmão....arrepiei....
wow!!! Onde isso aconteceu pelamordedeus?

Anônimo disse...

crazy!!! fiquei arrepiada da cabeca aos pes... de verdade isso?